sábado, 2 de abril de 2011

Duas Vidas - Capitulo 7



Sentia um frio terrível subindo minha espinha, e um vazio imenso. Som de sirenes por todos os lados, sinto uma dor muito forte por todo meu corpo, que me faz apagar. Durante um dos poucos momentos que me recordo, escuto alguém chorando, era uma mulher que parecia estar desesperada, mas apaguei de novo.

  - Então doutor, como os meninos vão ficar?              - Perguntou a mãe do Gui -
  - A situação não é boa, o Guilherme vai ficar bem, tem alguns hematomas, e um braço quebrado.
  - Mas o Kauã?
  - Bom, ele esta com uma hemorragia no abdome, tentamos parar o sangramento mas não conseguimos.
  - Como assim doutor?
  - sinto muito, mas... ele não vai passar dessa noite, sinto muito.
A mãe do Gui estava arrasada, o Guilherme estava bem , mas ela já me via como seu filho. E o pior estava por vir, ela ia ter que dizer isso para o Gui.
  - Oi mãe, como esta o Kauã?
  - Bom, filho... ele não esta muito bem não.
  - Como assim mãe?
Então ela segurou a mão dele e começou a chorar e disse:
  - É melhor você ir ver ele, porque talvez seja a ultima vez.
  - Como assim mãe, NÃO FALA ISSO, ELE NÃO PODE MORRER. Ele é meu amigo, é como fosse meu irmão, os médicos tem que fazer alguma coisa.
  - Sim filho, eles já tentaram. Mas não conseguiram estancar o sangramento.
O mundo caiu pro Guilherme, ele já mais pensou que uma simples viajem pode-se terminar assim. Entretanto ele engoliu o choro e pediu pra ir ate meu quarto. Quando chegou me viu deitado em uma cama cheio de aparelhos, e viu que estava faltando alguma coisa em mim.
  - Doutor, o que houve com ele?
  - Durante o choque as pernas dele foram esmagadas, então tivemos que amputar.
  - Isso é horrível, e o motorista?
  - Ele morreu no local. Você teve sorte de ter caido pra fora do caminhão na hora do choque, se não poderia ter morrido também.
  - Doutor, o senhor poderia nos deixar sozinhos?
  - Claro, mas seja rápido.
A visão que o Gui tinha era horrível, acho que nem ele saberia o que me dizer. Então se aproximou da minha cama, segurou minha mão e começou a chorar. Não sei como explicar, mas em meio ao vazio que estava, comecei a escutar um choro, então abri os olhos lentamente e com certa dificuldade disse:
  - Guiilhermeee...
  - Kauã? você acordou, como você esta? ta sentindo alguma coisa?
  - Onde estouu..  não consigo me mexer, não sinto... nadaaa..
  - O caminhão bateu, e estamos no hospital.
  - E você.. esta bem, não se machucou.. ?
  - Eu estou bem, fique quietinho, vai ficar tudo bem!
  - Gui.. você sempre mentiu muito mau...
Logo comecei a ter dificuldades pra falar, então resumi minhas palavras em uma frase...
  - Lembra Gui.., nossa amizade é como o amor das baleias... nunca morre, meeessmo.. após a morte. Sempre amigos... sempre.
Meus olhos começaram a se fechar lentamente e minha respiração a ficar mais fraca. Então uma luz vermelha no aparelho começou a piscar e a fazer um barulho muito alto.
  - Kauã!! KAUÃ!!!
A porta se abre e entram muitos enfermeiros correndo, que logo tiram o Guilherme da sala. Meu coração estava parando e já não respirava mais. O Gui olha pelo vidro da porta e consegue ver o medico tapando meu rosto com um lençol e olhando no relógio. Com lágrimas no rosto e uma tristeza sem fim, ele noto que estava sozinho de novo, que seu amigo tinha ido embora.

Como já não tinha mais ninguém por mim, a mãe do Guilherme cuidou de tudo, velório, enterro, tudo. O Gui estava muito mal, então não conseguiu ir ao velório, não ia conseguir me ver ali, daquele estado. Mas no fim do enterro ele apareceu, depois que as poucas pessoas que tinham ido foram embora.
  - Kauã, espero que você esteja bem onde estiver, nunca vou esquecer você, vai sempre ser meu melhor amigo.
De repente ele olha para traz e duas pessoas estavam se aproximando, para a surpresa dele era os meus avós, os mesmos que não queriam saber de mim.
  - O que vocês fazem aqui?                                        - Disse Gui -
  - Viemos assim que soubemos, lamento muito...         - Disse o vô -
  - Lamentam..? ISSO ACONTECEU POR SUA CULPA, PORQUE VOCÊS BATERAM A PORTA NA CARA DELE.
  - Lamentamos...
  - SAIAM DAQUI, vocês são as ultimas pessoas que ele gostaria que estivessem aqui.
Então eles baixaram a cabeça e se retiraram sem dizer uma palavra.
  - É isso meu amigo, nós somos uma familia, eu, você e a mãe. Sempre, não importa onde você esteja.
Logo começou a escurecer e o Gui foi embora, de cabeça baixa sabendo que voltaria sozinho dessa vez, sem seu melhor amigo ao seu lado.
Passou-se alguns meses mas as lembranças do Guilherme sobre mim, ainda estavam muito fortes. Ele praticamente não tinha vida social, só passava trancado no seu quarto, e pela madruga sua mãe podia escutar seu choro. Sem saber o que fazer ela mandou ele ir para o cassino de novo, ficar um pouco com sua avó para ver se conseguia ficar melhor. Chegando lá, as coisas não mudaram muito, pois todo aquele lugar trazia lembranças boas sobre nós dois. Logo pela manhã, ele levantou cedo, e saiu em direção a praia. Pegou o primeiro barca que foi para alto mar, assim como fez da vez que estava comigo.
  - Nossa meu amigo, você nem sabe como me faz falta... se eu tivesse impedido essa viajem, nada disso teria acontecido, e você estaria por aqui agora.
Então escutasse sons de um grupo de balias passando como da outra vez, e uma brisa suave toca seu ombro, e uma voz serena diz:
  - Amigo, acidentes acontecem, e nada disso é culpa sua. Seremos amigos pra sempre, estarei sempre no seu coração e você sempre no meu. Você nunca vai estar sozinho.
Percebendo de quem era aquela voz, Guilherme olha desesperado para todos os lado.
  - Kauã, é você? onde você esta? me diga?
E não se ouve mais nada, apenas o barulho da água e o motor do barco.
  - Sim... como não percebi antes, você sempre esteve aqui... dentro do meu coração, de onde nunca vai sair.
Um sorri veio no seu rosto como já não acontecia a muito tempo, e percebeu que não importa se ele esta vivo ou não, porque a amizade quando é forte e verdadeira, ela rompe todas as barreiras, a do preconceito, do orgulho e ate mesmo a da morte. E soube que desde o momento que entrei em sua vida, ele jamais estaria sozinho, e poderia tocar sua vida normalmente dali pra frente, porque amigo não se troca, não se compra, nem se vende... amigo a gente sente.




Fim...